quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Foi assim

Eram vizinhos, ou mais ou menos, a tia dele é que morava na casa ao lado. Dia de domingo, quando acabava a missa, as mães davam uma folga, iam trocar uma ideia. Subúrbio é assim, ou era, sei lá, a rua uma extensão da casa da gente, ainda mais em vila. E não tinha shopping pra hipnotizar o povo. Às vezes o garoto aparecia. Botava o olho comprido. Azul. Assim, como os príncipes das histórias da Disney. Já a mãe da menina tinha o instinto das madrastas das histórias. Marcava sob pressão.
Bom era quando tinha festinha de rua. Não era nada grande - se fosse uma festa junina, por exemplo, tinha terreno baldio onde se podia acender uma fogueira, soltar fogos de artifício, essas coisas, nada sofisticado. E lá estavam as famílias, agregados, o garoto e a garota. E a mãe.
Dia de clube. O vizinho era sócio de um clube legal, com piscina, e lá ia todo mundo. Todo mundo. 
Num dia desses dias se comemorava um aniversário na casa da vizinha. Algazarra total, porque a turma bebia bastante, música alta, pessoas falando. A menina se cansou daquilo e se afastou. Foi para o muro, pra ficar olhando para a rua da vila. Dali ela via a casa dela e toda a vila, porque estava no alto da ladeira, e ainda conseguia ver a rua lá embaixo pelo vácuo do terreno baldio. De repente, sentiu alguém atrás dela, chegando bem de pertinho, até praticamente não restar mais espaço entre eles. O menino pôs um braço sobre seu ombro, e falou baixinho no ouvido dela, “quero te namorar”. Ela soltou o ar – nem sabia que tinha prendido – e o tempo parou.

Clarice: escrever é o mesmo processo do ato de sonhar: vão-se formando imagens, cores, atos, e sobretudo uma atmosfera de sonho que parece u...