terça-feira, 17 de outubro de 2017

Daquilo que nos envergonha

O Sítio Arqueológico Cais do Valongo, localizado na zona portuária do Rio de Janeiro, ganhou em julho de 2017 o título de Patrimônio Mundial da UNESCO. O Cais foi encontrado em 2011, durante as escavações feitas para a reforma da zona portuária. Suas ruínas são os únicos vestígios materiais da chegada dos africanos no país.
Não era um simples ponto de desembarque: 4 milhões de africanos escravizados vieram para o Brasil em 300 anos de tráfico; 2,4 milhões entraram no país via Rio de Janeiro, e 1 milhão deles pelo Valongo, entre 1774 e 1831. Para se ter um parâmetro, os Estados Unidos receberam cerca de 400 mil em toda a sua história de tráfico.
O historiador Carlos Eugênio Líbano Soares, da UFRJ, afirmou que o Cais do Valongo é o complexo negreiro mais importante do país na história da diáspora africana na era moderna.
A Intendência Geral de Polícia da Corte da Cidade do Rio de Janeiro fez construir o Cais do Valongo em 1811, para atender a antiga determinação do Vice-Rei, o Marquês de Lavradio, de 1779. Seu objetivo era retirar da rua Direita, atual rua Primeiro de Março, o desembarque e comércio de africanos escravizados.
Ao longo dos anos, o Cais passou por sucessivas transformações. Na primeira intervenção, em 1843, foi remodelado para receber a Princesa das Duas Sicílias, Teresa Cristina Maria de Bourbon, noiva do então futuro Imperador D. Pedro II, e passou a se chamar Cais da Imperatriz. As reformas urbanísticas da cidade no início do século XX fizeram com que o Cais da Imperatriz fosse aterrado em 1911. 
Ao ser nomeado patrimônio mundial, o Cais do Valongo fica no mesmo nível de outros lugares reconhecidos pela UNESCO como locais de memória e sofrimento, como um memorial em Hiroshima, no Japão, e o Campo de Concentração de Auschwitz, na Polônia. 
Penso que há uma tendência no Brasil ao "esquecimento" de sua história, de se tentar ignorá-la ou pintá-la de cor-de-rosa. Não se dá o devido valor à preservação da memória, como não se dá à ciência e à educação. E o racismo ainda vive. O Cais do Valongo tem um significado extraordinário para nos fazer lembrar dessa vergonha, desse crime contra a humanidade. Esperemos que a lição seja aprendida e que pelo menos o sítio seja preservado.
Sítio arqueológico do Cais do Valongo - acervo (2017)

A história do sítio arqueológico - acervo (2017)

A história do sítio arqueológico - acervo (2017)

A história do sítio arqueológico - acervo (2017)

Monumento ao Cais da Imperatriz - acervo (2017)

Sítio arqueológico do Cais do Valongo - acervo (2017)

Sítio arqueológico do Cais do Valongo - acervo (2017)

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