segunda-feira, 24 de abril de 2017

Viagens temáticas

Acho que faz todo o sentido fazer uma viagem inspirada em um livro ou filme, afinal, o que mais se faz é viajar por meio de personagens de ficção, ou mesmo da vida real, quando a biografia é bem feita. Por exemplo, ler a biografia de Catarina, a Grande, ou Catarina II da Rússia é uma ótima inspiração para se visitar o país. Recomendo muitíssimo o livro escrito por Robert K. Massie. Está em promoção na Livraria Saraiva. Estão na fila para ler as histórias de Pedro, o Grande e dos Romanov. 

Não é que a gente não saiba que esses e outros reis, rainhas, czares e czarinas, e nobres de todos os tipos e tamanhos tenham vivido na opulência enquanto o povo era explorado. Afinal, essa é a história dos regimes autocráticos, das ditaduras, e mesmo de muitas autoproclamadas democracias. Você tem duas opções básicas (mais todas as nuanças no meio): ou fica em casa reclamando de tudo e de todos, ou aprende história da maneira que mais lhe agradar. A maioria de nós começa e termina nos livros, revistas, jornais, televisão, cinema, etc., mas às vezes surge a oportunidade de se conhecer alguns lugares, e na minha opinião, o melhor então é mergulhar de cabeça.

Por exemplo, eu adoro o centro da cidade do Rio de Janeiro, com seus resquícios de arquitetura colonial, independente das críticas que tenho à colonização. Só não sou muito fã de estátuas, e também acho que às vezes cabe fazer uma revisão de nomes de ruas, prédios oficiais e similares. Por que homenagear um ditador ou um senhor de escravos? Grande e retumbante NÃO.

Então, imaginando continuar de onde tinha parado, e enquanto decidia se começava por Harry Potter ou Game of Thrones, eis que Catarina se interpõe, essa mulher mais do que fascinante e de grande inteligência. O bom de ler biografias é dar fim às inverdades que se perpetuam via intrigas e maledicências (embora algumas fantasiem mais do que conto de fadas). A história está cheia delas, apesar de parecer que mentiras foram inventadas pelos políticos atuais. 

E como não ficar impressionada com esse palácio?

Originalmente não era muita coisa, mas a filha da primeira Catarina, a imperatriz Elizabeth, elegeu-o como sua residência de verão, e empregou inúmeros arquitetos para redesenhá-lo de modo a superar Versalhes, por volta de 1742. Rivalidades... O que para nós representaria a troca de um piso, pintar as paredes ou pendurar um quadro, para ela significou, dentre outras providências, usar 100 kg de ouro nas fachadas e estátuas.

Em 1770 chegou a vez de Catarina II redecorar, mas ela mandou suspender os trabalhos em curso, considerados extravagantes:

"O palácio estava então em construção, mas era trabalho de Penélope: o que era feito hoje era destruído no dia seguinte. Aquela casa tinha sido desmantelada seis vezes até as fundações, e depois reconstruída novamente até chegar ao estado atual. A quantia de um milhão e seiscentos rublos foi gasta na construção." (Memórias de Catarina II)

Palácio de Catarina, vista parcial - Pushkin, Rússia, 2016 (acervo pessoal)

O palácio foi ocupado pelos nazistas alemães durante a Segunda Guerra Mundial, e usado como alojamento e para a prática de tiro. Antes de partirem, eles o incendiaram, não sem antes roubarem a Sala Âmbar. Esse aposento era todo decorado em painéis de âmbar, folhas de ouro e espelhos. A história dessa pilhagem é um mistério. Os painéis foram enviados para a cidade de Konigsberg, na Prússia (hoje Kaliningrado, Rússia), e Hitler teria ordenado sua remoção. No entanto, o comandante local fugiu e a cidade foi alvo de pesados bombardeios da Força Aérea britânica. A Sala Âmbar original nunca mais foi vista, apesar dos inúmeros rumores que a cercam. Antes de seu desaparecimento, era considerada a oitava maravilha do mundo. 

 By jeanyfan - Own work, Public Domain, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=4062702

A sala foi recriada de acordo com desenhos originais, após 24 anos de trabalhos. Infelizmente, não pode ser fotografada. Vê-la é algo indescritível. E é exatamente essa sala, além do conjunto de salões formais projetados pelo arquiteto italiano Bartholomeo Rastrelli, que se destacam após a reconstrução do que foi tão descuidada e impiedosamente vandalizado. De 58 aposentos destruídos durante a guerra, 32 foram recriados.

O grandioso salão de baile (acervo)


Quem resiste a uma selfie? (acervo)


Detalhe de um dos tetos (acervo)


Não consigo me lembrar se é o retrato de Catarina II ou Elizabeth (acervo)


Um dos vestidinhos de Catarina (acervo)



 O lago no parque do palácio (acervo)
 

Para onde quer que se olhe, o deslumbramento (acervo)

Parece que a tradição de guerras conduzindo destruições generalizadas não acabou. Monumentos e pessoas sempre sofreram e continuam sofrendo todo tipo de violências, sob as mais variadas alegações. Nunca justas. Cabe-nos aproveitar as oportunidades que surgem e enriquecer o espírito, tanto travando contato com pessoas interessantes como conhecendo aquilo que o ser humano é capaz de construir quando se empenha nesse sentido. 

Informações para a visita ao Palácio de Catarina em Tsarskoe Selo (Pushkin)

Maio & Setembro: quarta a domingo 12.00 -17.00.
Junho a Agosto: quarta a domingo 12.00 -19.00; segunda-feira: 12.00 -20.00. Fechado: terças-feiras.
Outubro ao final de abril: 10.00 -17.00 quarta a domingo, 10.00 -20.00 às segundas. Fechado nas terças-feiras e na última segunda-feira de cada mês. 


O site da cidade de S. Petersburgo (http://www.saint-petersburg.com/pushkin/catherine-palace/) dá direções para se chegar no palácio, partindo de lá: pegue um trem suburbano da estação Vitebsk até a estação Pushkin, e depois os ônibus 371 ou 382 até os portões do parque. Outra opção são os inúmeros microônibus (K-286, K-287, K-299, K-342) que vão de Moskovskaya Ploshchad, perto da estação de metrô Moskovskaya. Tsarskoe Selo fica a 25km ao sul de S. Petersburgo, e a viagem dura cerca de 30 minutos. Alerta-se, porém, que na hora do rush, a estrada para Pushkin sofre regularmente imensos engarrafamentos. 

Fica a critério de cada um. Nós optamos por segurança. Procuramos uma empresa de turismo local, com guia em inglês. Não deparamos com muitas opções. Circulamos pelo ponto de partida, onde havia vários quiosques e ônibus de turismo, e apenas essa que escolhemos tinha guia em inglês. Todos os demais tinham guia em... russo. Se sua fluência nessa língua é precária ou anda enferrujada, como a nossa 😉, pense bem. Mas a atração é certamente imperdível.

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