sexta-feira, 15 de janeiro de 2010



Viajar é passar de um lugar para outro, física e mentalmente. Com todas as ansiedades que isso envolve. E os sustos. Essa balela de ser uma mulher do século 21 não rola. O avião pode cair, balas perdidas circulam todos os dias, terroristas estão no cardápio todos os dias, e desde que nascemos podemos morrer ou sofrer acidentes. Drama? Não. Realidade. Cabe manter o medo em um nível de normalidade, sabendo que o que será, será, e confiar que serei capaz de tomar a melhor decisão possível na hora certa. Whatever. E contar com a ajuda divina, porque conto mesmo.
Porque depois daquele motorista de táxi mafioso, ainda achei de me perder no meio do mato em Praga. Ora, pois. Já contava com alguma façanha do tipo, em se tratando de andar por países de língua que não domino, mesmo quase todo mundo se comunicando em inglês. Só que tem as benditas placas, etc. Já tinha até andado de metrô, ido ao castelo, já estava descendo, quando de repente me vi num lugar diferente. Diferente, leia-se, um bairro residencial, sem ninguém nas ruas a não ser algumas crianças brincando, numa tarde de sábado, nenhum comércio à vista, ninguém para dar informações. Pânico se formando. Começo a andar rápido, muito rápido, chego num lugar que parece mais uma zona industrial, e num ponto de ônibus. Algum alívio. Resolvo pegar um ônibus (ou bonde, sei lá como chama aquilo). Os passes se compram no próprio ponto, numa máquina, com moedas. Tenho poucas, não adianta ter muito daquele dinheiro já que parto no dia seguinte, e quase não vem troco em moedas.
Pego a tal condução, tralalá. A direção é um lugar chamado Bilá Hora. Tudo que queria eu era descer mais rápido do castelo e chegar na Ponte Carlos. Só que o tram seguiu toda vida por uma estrada muito bonitinha, campos verdejantes... e eu cada vez mais desesperada... olhava para um lado e para outro, só procurando onde encontrar uma maquineta pra comprar outro passe de ônibus e... NADA! Sentar e chorar? Minha solução favorita é ir até o ponto final e decidir, foi o que fiz. E rezei. Muito, mas muito mesmo.
Cheguei num lugar que era um subúrbio, uma província, muito bonitinha, mas não tinha nada, nadinha. Ponto final, tinha a maquininha. E eu não entendendo nada. Olhava, um burro olhando pro palácio. Peguei as moedas, tentando decidir o que comprar pra fazer o trajeto de volta. Um frio de rachar, tirei uma das luvas. Aí veio um anjo da guarda, essa moça que compensou as pragas (com o perdão do trocadilho) infernais que me azucrinaram antes, e perguntou - em inglês (!) o que eu precisava, pegou as moedas, comprou o bilhete, me explicou tudo, rasgou um pedacinho de papel dela, que é esse aí em cima, escreveu o nome da estação onde eu deveria saltar e o nome da Ponte Carlos em tcheco, e falou em inglês, para garantir que desse certinho. Não é um anjo? E tem quem não acredite.
Pois foi assim a minha viagem. Abençoada. Por isso eu falei das pessoas ruins, caso alguém leia o que eu escreva, para alertar, mas deixei pra lá, porque fica à conta das intempéries normais da vida. Mas tanta gente boa apareceu para me ajudar - essa em Praga tinha asas honorárias, realmente, e os hosts do Dahlia Inn também foram muito fofos, mas o menino que espontaneamente me deu direções na estação de trem em Berlim, ou a senhora que me ajudou a carregar a mala em Londres na estação, o senhor no trem na Victoria Station também em Londres são exemplos de que a humanidade tem corações solidários pulsando por aí, no dia-a-dia, em ações simples. A essas pessoas minha gratidão eterna e uma prece diária.

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